terça-feira, 5 de agosto de 2008

Pinto as paredes de minha casa, mas não da minha consciência.


Acordei por volta das nove e meia e, como de costume, fui tocar minha viola. É estranho, mas prefiro primeiro pegar meu violão e tocar alguns acordes do Caetano, do que tomar café da manhã. Acho que um lance de alimentação musical...
Depois disso, tomei banho e, finalmente, um cafezinho básico. Duas horas mais tarde me aparece o Jeremias na porta. Minha mãe sempre chama o Jeremias para pintar as paredes de casa ou somente fazer pequenos acertos nas paredes. Ele é um sujeito super bacana, boa praça. Para ele radinho ligado, uma boa conversa e um cafezinho fresquinho é o que interessa.
Pedi que ele entrasse e disse também que mamãe não estava. Ele me cumprimentou simpaticamente e disse que não veio falar com minha mãe (a Dona Ana para ele), mas o assunto é com minha tia, pois ela iria mostrar um apartamento para o nosso querido amigo pintar.
Nesse meio tempo, ficamos eu e o Jeremias na sala. A televisão ligada e nós dois em silêncio. Até que o Jeremias meio envergonhado perguntou-me.
- Como é que vai a faculdade garoto?
Fiquei meio surpreso, digamos assim, já que nem imaginava que o Jeremias sabia algo a meu respeito. Mas vai ver foi mamãe que contou né. Respondi que tava indo bem. Estava de férias e que já conclui metade do curso. Reiterei ainda que cursava psicologia.
Meio cabisbaixo ele me disse.
- É. Hoje em dia sem estudo ninguém vai pra frente. Perdi muitas oportunidades num sabe? Mas também tive pouca chance nessa vida. Meu pai nunca deu incentivo pra nada de estudo. Para ele o essencial era ter comida na mesa. Ah... Isso, pelo menos nunca faltou lá em casa. Mas os tempos mudaram né? Hoje tá tudo difícil e tudo é mais caro. O que me sobrou mesmo foi pintar as casas por aí.
Assenti com a cabeça e perguntei para ele até que série ele fez. Disse-me que até a sétima.
Reforcei dizendo que não era impossível entrar na faculdade na idade dele. Era preciso muito esforço, mas se ele quisesse daria certo. Era só voltar aos estudos e se dedicar.
Mas para o Jeremias.
- Não meu filho. Eu estou muito cansado. Quero agora é me aposentar. Quero descansar ficando com minha família.
Sinceramente... Não queria ter falado nada disso. Na verdade eu lembrei de um belo texto de Paulo Freire, onde ele relata algo parecido com ocorrido comigo nessa manhã. Mas, ao invés de dizer que se ele quisesse estudar chegaria lá, isto é, valorizando apenas o que chamo aqui de “saber acadêmico”, ele destacou o saber do outro. Trocando em miúdos, eu deveria ter dito mais ou menos assim.
- Jeremias, você não conseguirá entender algumas das coisas que estudo, mas eu também não sei pintar paredes. Eu não consigo fazer belos acabamentos nas cozinhas das casas como você. Tampouco sei escolher tons e cores mais adequadas para pintar. Fiquei com impressão que deveria ter dito isso. Mas eu não disse. Pelo contrario, o incentivei a estudar feito um louco e somente assim ele entraria na universidade.
Eu preferi ficar com meu academicismo, ou seja, sempre reiterar que a academia é legal e todo aquele blá-blá-blá que faz todos quererem entrar na universidade.
Não questiono aqui o fato dos mais pobres adentrarem na universidade. Longe de mim focar a questão para esse âmbito, haja vista que as universidades, principalmente as universidades públicas são nichos apenas dos mais ricos. E os mais pobres ralando para pagar uma universidade particular.

No entanto, questiono essa espécie de mística que voga entre nós onde todos têm de entrar na universidade. Onde o saber universitário é o saber hegemônico. O saber que provém das universidades nos permite chamarmos uns aos outros de doutor. De onde surgiu isso? Nesse caso sugiro o livro “Os Bruzundangas” de Lima Barreto. O autor destrincha, poeticamente, o surgimento da “política do doutor” no Brasil pré-moderno.
Ninguém reverencia o saber do camelô, da costureira ou do pintor. Eu nunca vi um pintor ganhar quinze, vinte mil reais como um juiz. E, me permitam ainda dizer que não vejo como “menor” o fato de que um pintor sabe utilizar cores e tons das tintas e um juiz que entende das leis. Em minha concepção são saberes apenas diferentes. Sei que é um tanto polêmico isso, afinal passamos cinco, seis anos dentro das universidades e por isso queremos ter um bom emprego, um bom carro e um bom apartamento. Com relação a isso, indico ainda a música “Quando você crescer” de Raul Seixas.
O mais estranho dessa história e, talvez, seja só por isso que esteja escrevendo este texto é que somente eu o Jeremias iríamos almoçar em casa naquele dia. Mas quando ele soube disso recusou-se a almoçar comigo, dizendo estar atrasado. Minha tia disse que ele tinha tomado apenas café antes de sair de casa. Mesmo assim disse para ela que não queria almoçar conosco.
Prefiro nem me estender nessa historia para não pensar besteira. Enfim a verdade é que me sinto cansado. Canso de tudo. Cansado de mim.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Nos nunca mudamos...

É. Nós nunca mudamos. Não há ninguém que consiga nos separar. Nós combinamos em tudo, tanto é que sempre advinho o que você quer comer no café da manhã. Sei que você adora o leite morninho com torradas e quando está mais cansada (coincidência...eu também estou cansado!) pede que eu leve o café na cama. De forma que, você pode dormir um pouquinho mais tarde.
O frio facilita o encontro dos nossos corpos e lá pelas dez da manhã ainda estamos na cama, escutando beatles e falando dos amigos que fizemos na última viagem.
Sim! Parece meio hollywoodiano. Ficar aqui tentando expressar quão é bom tá contigo, mas você sabe, eu sou mesmo um romantico sem lei. Daqueles rídiculos mesmo...
Mas não é verdade que o Verissímo nos diz
que "a única pessoa livre, realmente livre, é a que não tem medo do ridículo.” Acabei de lembrar que você adora o livro que tem essa poesia. Lembro ainda que foi presente da minha mãe no nosso aniversário.
Sim! Eu sei! Não vou conseguir dizer o que quero. Ah. Eu quero estar com você, viver em uma casa de madeira, ser sempre verdadeiro. Eu quero voar e nunca descer, quero viver nossa vida e ter os amigos por perto. Eu quero viver com você aonde o sol surge.